DISTRIBUIÇÃO DESPROPORCIONAL DE LUCROS E O ITCMD

Por: Jailson Fernandes OAB/SC 20.146

A reforma tributária em andamento no Brasil, regulamentada pela Emenda Constitucional nº 132/2023, visa simplificar e modernizar o sistema tributário nacional. As principais mudanças propostas incluem a criação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que substituirá diversos impostos indiretos, e a contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), com o intuito de unificar e simplificar a tributação sobre o consumo.

Nesse contexto, podemos encontrar o Projeto de Lei Complementar nº 108/2024, que pretende regulamentar aspectos adicionais da reforma tributária. Referido projeto apresenta uma proposta controversa: a inclusão do ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação) sobre a distribuição desproporcional de dividendos, tratando-a como uma doação se realizada “por liberalidade” e sem justificativa comercial adequada.
A proposta, todavia, padece de ledo engano. Quem empreende no Brasil corre riscos absurdos com a insegurança jurídica. Este aspecto, por si só, afasta qualquer eventual “liberalidade” do empreendedor para definir a distribuição dos resultados alcançados a amargos custos pessoais, tal como sugerida pelo PLC nº 108/2024.

Essa proposta, quer-se afirmar, tem gerado severas discussões, exatamente porque o ITCMD é destinado a tributar a transferência gratuita de bens e direitos, definida pela Constituição e pelo Código Civil como doação. A distribuição desproporcional de dividendos, no entanto, é uma decisão societária baseada na remuneração dos sócios pelo capital investido e pelo seu envolvimento na administração da empresa, não sendo uma transferência gratuita de patrimônio.

Na prática, a distribuição desproporcional de dividendos ou lucros não se configura como doação em nenhuma dimensão que seja possível de ser estudada. A contrário disso, é uma maneira de remunerar sócios de acordo com seu engajamento e contribuição para a sociedade, independentemente de sua participação no capital social. O objetivo é recompensar aqueles que desempenham papéis mais ativos na empresa, promovendo uma distribuição mais equitativa dos lucros.

Portanto, tratar dividendos ou lucros desproporcionais como doação para fins de ITCMD não apenas distorce o conceito legal de doação enquanto instituto de direito privado utilizado constitucionalmente, como viola a competência tributária definida pela Constituição Federal de 1988. A tributação de dividendos pelo ITCMD comprometeria a isenção atualmente garantida pela União e violaria a repartição de competências tributárias entre União, Estados e Distrito Federal.

Neste sentido, entendemos que a proposta de incluir dividendos desproporcionais como hipótese de incidência do ITCMD é absolutamente inconstitucional, pois mistura conceitos tributários distintos e específicos, sem olvidar do eventual desrespeito em face da estrutura constitucional tributária e os limites que tal poder encontra na própria Carta Magna.

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